Vídeos: https://we.tl/t-h8AOz8sBCF
Santo André, 22 de agosto de 2022 – A pista de skate do Parque da Juventude Ana Brandão, em Santo André, quinzenalmente se transformou em uma alternativa de qualidade de vida, lazer e terapia para os usuários do Caps (Centro de Atenção Psicossocial) Infantojuvenil.
Referência em promover cuidado humanizado, a coordenação de saúde mental constantemente implementa diferentes atividades terapêuticas, explorando novos espaços e formatos, de acordo com o perfil do usuário. Outras atividades externas como passeio para praia, visita ao circo, piquenique e desfile, já foram desenvolvidas.
Ansioso para participar da primeira aula, Christopher Brian Barbosa, de 6 anos, fez uma pergunta inusitada e pegou toda a equipe de surpresa enquanto escolhia o skate que ia utilizar. “Um dia eu vou ser fera no skate?”, indagou o pequeno, com olhar carregado de esperança.
“Eu espero que um dia você seja muito fera no skate, mas o mais legal é você se divertir. Às vezes não precisa fazer manobra, você precisa se sentir bem no que faz. Como você está hoje?”, respondeu o arte educador Henrique Fróesm, enquanto colocava o equipamento de segurança na criança para iniciar as atividades.
Há alguns meses, após perceber que a criança tinha dificuldade em se concentrar, a família de Christopher procurou auxílio em uma unidade de saúde e o menino foi encaminhado para o Caps Infantojuvenil. “Ele é muito agitado, tem dificuldade em se concentrar e encaminharam para participar desse grupo. Ele gosta muito do pessoal, eles dão atenção pra ele e, apesar de ter um pouco de medo, ele estava muito empolgado para andar de skate”, disse o pai, Fernando Oliveira Ferreira.
Praticar a atividade proporciona diversos benefícios para a saúde física e mental, trabalha o equilíbrio bilateral e ambos os hemisférios do cérebro.
“O skate é muito potente para psicomotricidade, inclusive, algumas crianças com transtorno do espectro autista (TEA) estão sendo inseridas no skate. O que eu vejo de ganho é a reabilitação psicossocial, estamos falando de crianças e adolescentes que estão em sofrimento e não estavam tendo contato com adolescentes que não estão em sofrimento. Conseguir sair e socializar é o maior avanço que a gente tem observado”, explica Henrique Fróesm.
“Alguns adolescentes estão em um processo de sofrimento muito grande e, quando iniciaram a atividade, pararam de se cortar. Com skate você vai cair e, apesar de ser um jeito diferente de se machucar, gera o mesmo alívio em um sentido diferente”, completa o arte educador.
Segundo a coordenadora de saúde mental, Marinês Santos Oliveira, esse é o grande desafio do modelo de atenção psicossocial. “Há desafios importantes, por vezes da compreensão desse modelo, o quanto estar no seu lugar de vida e de existência com a equipe que cuida pode trazer outros projetos terapêuticos mais ampliados, mais fortalecidos, criar novas redes sociais e outras grupalidades, ainda mais tratando de crianças e adolescentes”, explica.
“O modelo psicossocial quebra a ideia hegemônica e persistente que só há cuidado no modelo ambulatorial, em uma sala fechada, com especialista, dia e hora marcada. É uma quebra de paradigma e é um modelo que a gente vem tentando ampliar e fortalecer no país por 30 anos do processo da reforma psiquiátrica. Sem contar que essas crianças e adolescentes estão isolados há dois anos por conta da pandemia. Essa prática, fora das salas, dos muros dos serviços, ganha um outro tom e torna-se ainda mais profícua”, finaliza Marinês Oliveira.
O educador social Anderson Figueira Castro trabalha em um abrigo da cidade e acompanha uma criança de 5 anos e dois adolescentes, de 12 anos e 15 anos, nas atividades do Caps. Impressionado com o resultado da atividade, Castro elogia a terapia. “Melhorou muito o comportamento. Eles gostam muito, praticam o esporte e fazem amizade. Os profissionais estão de parabéns pela iniciativa”, disse.
Redução de danos - Para o acompanhante terapêutico e especialista em saúde mental, Farley da Silva Graciano dos Santos, de 33 anos, a atividade é uma forma de redução de danos. “Muito dos meus amigos usam substâncias químicas e percebi que, enquanto eles estão andando de skate, não estão utilizando, isso é redução de danos. Skate é uma forma de redução de danos e quando a gente fala de saúde mental, a gente fala de qualidade de vida. É muito legal trabalhar em um lugar que eu possa utilizar o skate de uma forma terapêutica”, comenta.
“Quando a gente criou esse grupo, pensamos em plantar a semente de praticar alguma coisa e de encontrar alguma coisa que você ame e direcionar a sua energia para aquilo. O skate é um esporte individual e nem sempre ser individualista é ruim, se a criança não quiser permanecer com essa prática depois da semente plantada, ainda assim, já conseguimos trabalhar a interação social e equilíbrio”, conclui o acompanhante terapêutico.
A estudante de psicologia Sara Rufino Bujeno, de 22 anos, atua na parte administrativa do Caps e também tem uma história de redução de danos que nasceu com o skate. “Eu andava de skate e pra mim foi uma super redução de danos porque a escola é difícil para todo adolescente, eu não sabia em qual grupo eu estava e, por um tempo, o skate foi algo que fazia eu gastar toda energia que estava presa em mim, estando feliz ou triste. O esporte faz isso com as pessoas, com a produção de endorfina, a gente tem que trazer isso para as crianças e fazer com elas se movam para ver mais o espaço e compreender o dia a dia”, afirma.